Olivia Colman herdou o papel da monarca na terceira temporada em 2019, após inesperadamente receber o Oscar de Melhor Atriz pelo papel da rainha Anne no filme A Favorita (na época todos davam como certa a estatueta para Glenn Close por A Esposa ou Lady Gaga por Nasce uma Estrela). Sua interpretação como Elizabeth II na terceira temporada de The Crown, em 2020, também lhe rendeu um Globo de Ouro como Melhor Atriz em Série Dramática. A série chega em sua quarta temporada alçando a marca de 6 indicações ao Globo de Ouro 2021. Ela empata na liderança de indicações desta edição ao lado de outra produção da Netflix, o filme Mank, do diretor David Fincher. Além da óbvia indicação de Melhor Série Dramática, nas categorias de Melhor Atriz em Série Dramática e Melhor Atriz Coadjuvante temos duas indicadas de The Crown em cada, o que aumenta as chances do seriado de levar o prêmio. Olivia Colman é novamente indicada por seu trabalho como a Rainha Elizabeth II, mas assim como a monarca inglesa se viu eclipsada pelo brilho de Diana Spencer, sua concorrente é Emma Corrin, responsável por uma visceral interpretação da Princesa de Gales. Ao contrário de muitas obras biográficas sobre Lady Di, inclusive documentários sobre sua vida, aqui não há 100% do glamour e esplendor que estamos habituados a vê-la. Sobre seus problemas com bulimia, por exemplo, as cenas são tão pesadas e explícitas que os episódios em que elas estão inseridas receberam um alerta na abertura e encerramento com mensagens para, caso o espectador se identificar com a situação, procurar auxílio médico especializado. Além disso, o relacionamento de Diana e Charles está longe de ser um conto de fadas. Por mais que Peter Morgan, showrunner da série, diga que a série é uma “ficção inspirada em fatos históricos”, é impossível não sentir raiva do príncipe por ele usar seu relacionamento com Diana como uma fachada forçada pela família real, enquanto seu relacionamento romântico e real era com Camilla, ainda mais que sabemos que hoje ele é casado com seu eterno amor. No meio disso, compreendemos também o quanto Charles se sentia enciumado com a imensa atenção que a princesa recebia da imprensa. Se ele era o herdeiro da coroa, ninguém parecia notar, pois Diana sempre foi o centro das atenções desde que o namoro foi anunciado. E é exatamente esta guerra de egos que faz The Crown tão espetacular. Por mais que exista toda uma indústria de celebridades, e os tabloides ingleses explorem isto à exaustão, a série ainda consegue pincelar os membros da família real em camadas de humanidade que nunca tínhamos cogitado. Se na categoria de Melhor Atriz a briga é entre rainha e princesa, já entre as atrizes coadjuvantes temos duas Margaret que não podiam ser mais opostas em suas personalidades. Helena Bonham Carter como a Princesa Margaret, a rebelde irmã caçula de Elizabeth, e Gillian Anderson como a Dama de Ferro e primeira mulher a se tornar primeira-ministra no Reino Unido, Margaret Thatcher. Desde a terceira temporada Helena Bonham Carter dá vida à rebelde princesa, feminista em atitudes, sempre pronta a quebrar todo e qualquer protocolo, e um prato cheio para as manchetes de jornal numa época em que o termo paparazzo ainda não fora cunhado. Tão vaidosa que se casou com um fotógrafo, a contragosto de toda família real. Baladeira, beberrona e fumante, faleceu aos 71 anos de complicações por conta das incontáveis noites acordada em festas regadas à muita bebida e cigarros. Com este background, é quase impossível visualizar outra atriz que não seja Helena Bonham Carter dando vida à Princesa Margaret. (Nas duas primeiras temporadas Vanessa Kirby interpretou a princesa. Este ano a atriz também concorre ao Globo de Ouro pelo filme dramático produzido pela Netflix Pieces of a Woman). Helena consegue dar o tom certo de rebeldia, sem ser caricata, mantendo todo o charme e elegância que Margaret carregou até o final de sua vida. E na outra ponta temos Thatcher, vivida por Gillian Anderson, completamente caseira, viciada em trabalho e totalmente incapaz de se divertir. Se aquela Margaret vive uma vida festejando, esta não conseguia fazer outra coisa que não fosse trabalhar, seja por seu país ou por sua família. Em um dos momentos mais marcantes da série, a primeira dama e seu marido são convidados a passar um final de semana na casa de campo da rainha. Durante o jantar, em que brincadeiras estavam sendo realizados para descontrair os convidados, Thatcher não conseguia sequer relaxar para participar de um destes momentos de risada entre os participantes. E apesar de ser um período de descanso, ela foi carregada de documentos de trabalho do ministério. Após apenas um dia em meio àquele que seria um ambiente despojado, para se desligar das pressões do mundo, ela se viu sufocada pelo despojo alheio e, desesperada, foi embora para casa, alegando à rainha Elizabeth II que precisava trabalhar para conter alguma crise. Muitos podem usar como referência a interpretação de Meryl Streep, que lhe valeu o Oscar em 2013 pelo filme A Dama de Ferro, ao assistirem Gillian Anderson interpretando sua versão de Margaret Thatcher. Gillian já tem sem seu currículo um Globo de Ouro como Atriz em uma Série Dramática, conquistado em 1997 quando vivia a agente do FBI Dana Scully na badalada série Arquivo X. Obviamente que a interpretação e o Oscar de Meryl foram merecidíssimos, mas a proposta e energia gastos em um filme e um seriado são completamente distintos. Enquanto o filme faz um recorte temporal muito maior na vida da Dama de Ferro, explorando o relacionamento com seu marido, na série The Crown temos um pequeno recorte histórico centrado no seu período como primeira-ministra, explorando sua relação com a monarquia. A maneira como as atrizes se entregam aos papéis também são diferentes. Thatcher tinha maneirismos próprios, na fala e nos gestos, além do figurino, cabelo e maquiagem quem em muito ajudam a visualizar a figura histórica ao ponto de dissolvermos a atriz e só enxergarmos Margaret. Este, aliás, é o grande destaque de The Crown desde sua primeira temporada: os personagens são todos figuras de um mundo muito distante do nosso cotidiano de plebeus, mas os mais primitivos e mundanos conflitos de amor, ódio, ciúmes e traição são universais e independentes de títulos ou fama. Para conferir filmes e séries indicados ao Globo de Ouro 2021, não deixe de acompanhar a cobertura especial do Showmetech! Fontes: Golden Globes, IMDb e Netflix.